
Não seria justo atribuir apenas a Filipe Luís a responsabilidade de decidir sobre a utilização de Bruno Henrique, agora indiciado pela Polícia Federal. Após investigação, a PF concluiu que o atacante provocou de forma deliberada um cartão amarelo, beneficiando apostadores. A decisão sobre seu aproveitamento em campo é institucional: o Flamengo optou por seguir escalando o jogador enquanto ele exerce seu direito de defesa e aguarda julgamento.
A escolha, contudo, carrega riscos evidentes, como a possibilidade de ovação de um jogador acusado de manipular resultados ou a impressão de que um caso tão grave esteja sendo normalizado. Ainda assim, é preciso reconhecer o princípio da presunção de inocência.
Mais do que colocar Bruno Henrique em campo numa partida já decidida, Filipe Luís demonstrou coragem ao abordar o tema em entrevista. Suas declarações foram mais profundas do que boa parte das manifestações já vistas entre profissionais do futebol sobre a relação entre o esporte e as apostas. Ao mesmo tempo, revelou a complexidade de tratar o assunto, mesmo para quem, como Filipe, demonstra clareza em seus valores e posições.
Num cenário em que a indústria das apostas estendeu seus tentáculos por toda a estrutura do esporte, foi um gesto raro: um treinador de um dos clubes mais populares do país abordando as apostas como questão social, alertando para os riscos da dependência e do impacto financeiro sobre famílias. Filipe também mencionou restrições publicitárias impostas a indústrias como a do tabaco, e assumiu publicamente o compromisso de não atuar em campanhas de casas de apostas.
Dizer o que se pensa sobre o tema exige coragem. Afinal, neste século, as apostas representaram a principal fonte de dinheiro novo no futebol, irrigando clubes, federações, ligas e empresas de mídia. Qualquer restrição à publicidade impactaria diretamente esses setores — e, consequentemente, profissionais como o próprio Filipe Luís.